Quem tem filhos ou trabalha com crianças sabe bem que as crianças a uma determinada altura dizem NÃO a tudo. Por volta do ano e meio/dois anos de idade surge a chamada fase do não. Costuma ser bem desafiante deixando os pais com os cabelos em pé.
POR QUE AS CRIANÇAS DIZEM NÃO
A cientista Maria Montessori tem uma explicação clara para isto acontecer. É que até ao ano e meio/dois anos de idade, a criança depende do adulto quase para tudo, para andar, para se vestir, para comer etc. Ao atingir o ano e meio, o bebé já tem a parte motora, suficientemente, desenvolvida para poder movimentar-se no mundo (caminhar, agarrar, carregar, subir e descer) ou seja, já anda, já pode comer sozinho com agilidade e até pode começar a vestir-se sozinho (se o deixarem), a língua começa a soltar-se e surge a linguagem.
Aliado ao desenvolvimento físico e mental, o bebé que até aqui estava habituado a estar ao cuidado dos adultos para tudo, começa a desenvolver uma outra competência – a vontade e é nesse momento de maior independência em relação ao adulto, que a criança pequena percebe que a sua vida é limitada e controlada pelos adultos.
Até agora o bebé dizia “mãe” e “pai”, dava nomes aos objetos, às pessoas ou a situações específicas, deixando os pais cheios de orgulho com tamanhas conquistas quase diárias. Porém, entre os 18 e os 24 meses, a palavra “NÃO” parece ter substituído todas as outras. Esta atitude marca o momento em que a criança entende que tem vontade, mas que essa vontade e controlada pelos adultos. Assim, o bebé também percebe que esta nova palavra é uma forma de testar a autoridade e tentar libertar-se dela.
Ao ouvir inúmeros “nãos” dos seus familiares nas suas tentativas de experienciar as possibilidades que o mundo oferece, a criança incorpora a palavra NÃO no seu vocabulário, passando a usá-la para expressar-se. Também pode acontecer, a criança estar somente a imitar o que ouve. E se a palavra NÃO é algo que ouve demasiadas vezes, essa repetição, também, pode acontecer sem que a intenção seja desafiar o adulto.
Ao ouvir inúmeros “nãos” dos seus familiares nas suas tentativas de experienciar as possibilidades que o mundo oferece, a criança incorpora a palavra NÃO no seu vocabulário, passando a usá-la para expressar-se. Também pode acontecer, a criança estar somente a imitar o que ouve. E se a palavra NÃO é algo que ouve demasiadas vezes, essa repetição também pode acontecer sem que a intenção seja desafiar o adulto.
CARATERÍSTICAS DA FASE DO NÃO
1. Negação excessiva
O principal comportamento da criança na “fase do não” é a negação excessiva, que pode ser verbal ou mostrar resistência à realização de determinadas tarefas.
Assim, além de dizer “não” em praticamente todas as interações com os familiares, a criança oferece relutância, geralmente física, em ações como dar a mão para atravessar a rua e ir embora de algum sítio, por exemplo.
2. Corpo mole
É comum que a criança faça “corpo mole” para comer, andar, tomar banho, trocar de roupa, guardar brinquedos etc., agindo de forma lenta.
3. Fingir que não ouve
Costuma negar a satisfazer pedidos e cumprir ordens, muitas vezes, fingindo até não ouvi-los.
INTERPRETAR O NÃO
Andar, desfraldar, dizer as primeiras palavras. O bebé torna-se independente e descobre o mundo. Ao mesmo tempo, a personalidade do bebé manifesta-se e recorre frequentemente ao “NÃO”, mas também ao “eu quero”, ao “tu, não” e a outras expressões deste género, por vezes, acompanhadas de birras.
Isto dá aos pais a sensação que a criança não os ouve e isso pode ser de facto frustrante. Contudo, esta fase faz parte do desenvolvimento da criança.
Ao dizer “NÃO”, as crianças estão a afirmar-se e o que querem dizer é : “Eu sou”. Isto é uma forma de se afirmarem e além disso estão a construir o seu caráter e a sua personalidade, diferenciando-se assim dos seus pais.
Assim, quando nós dizemos à criança: “Anda vamos embora ”, e a criança diz um “Não!” o que ela quer dizer é:
- “Eu quero escolher o que eu quero fazer, não quero fazer o que tu queres agora”.
- “Eu sei movimentar-me, e posso fazer isso sozinho, sem seres tu a fazer”.
- “Obedecer-te sempre cansa. Quero poder ser eu a fazer à minha maneira.”
O QUE FAZER NESTA FASE
Geralmente, contrariamos a vontade da criança e obrigamo-la a ser obediente, o que pode até resultar na hora, mas terá consequências no futuro. Existem outras opções. Seguindo a linha montessoriana, dar liberdade à criança é uma das soluções, sabemos que isto pode soar estanho, mas já sabemos também que quando falamos em liberdade em Montessori não é a liberdade de deixar fazer tudo. No geral, quando uma criança diz “Não!”, faz isso porque sabe que o não é a forma que tem para tentar ser mais livre e poder escolher. Então, quando falamos em liberdade tem a ver com três tipos de liberdade todas elas condicionadas por nós.
1. Liberdade no ambiente
Isto significa preparar a sua casa para o bebé/criança. Removendo obstáculos e permitir que o bebé (em segurança) ande pela casa, ou seja, preparar a casa pensado na criança.
2. Liberdade de expressão
Dar liberdade à criança para que possa expressar-se livremente, ou seja, se ela quiser chorar pode fazê-lo. Devemos permitir todas as emoções, mas não todos os comportamentos. Ainda nesta linha, se realmente queremos que a criança não use tanto a palavra NÃO então temos de usar, menos vezes, e passar a utilizar o “não” com moderação, já que, a criança pode estar com alguma fixação na dita palavra. Isso não significa abandonar o termo, mas, utilizá-lo somente quando necessário. Já pensou na quantidade de nãos que, normalmente, dizemos às crianças!?
3. Liberdade de escolha
Dar à criança a oportunidade de escolher pode ser uma boa estratégia. Um bebé que ainda não fala pode escolher, apontando, se quer uma maça ou banana, por exemplo.
Se a criança puder escolher entre as opções e na ordem que quer fazer as coisas isso pode ajudar :
1. “Filho, queres brincar primeiro, e depois tomar banho, ou quer tomar banho primeiro, e depois brincar?”.
2. Ele também pode escolher como fazer as coisas: “Filho, queres tomar banho na banheira ou de chuveiro?”
Geralmente, nem nos apercebemos que a criança pode fazer escolhas, escolhas simples que não trazem mal ao mundo. Não vamos pedir para a criança escolher se quer levar uma vacina ou não, por exemplo. É muito mais fácil obedecer numa coisa, do que obedecer em todas as coisas. A criança que precisa de estar sempre a obedecer, está sempre a tentar não o fazer. O “Não!” é para a criança a libertação do autoritarismo do adulto.
Assim, quando os nossos filhos dizem que não vão fazer algo, e nós precisamos que eles façam, podemos sugerir várias formas de se fazer a mesma coisa, dar alternativas aquilo que a criança quer, sem dizer logo não. Por isso, a melhor sugestão é: Não espere pelo Não. Antes do seu filho dizer “Não!”, dê-lhe opções.
SEJA PACIENTE
Contudo, não podemos falar do comportamento da criança sem falarmos do nosso. A nossa atitude perante a criança é muitas vezes o que vai determinar a reação e o seu comportamento. Por isso, o melhor para esta fase e para todas as outras é ser paciente. Nesta idade (dois anos) ainda podemos usar a ferramenta da distração, assim, perante uma situação tensa de nãos constantes, nada melhor que virar a atenção da criança para outra coisa e assim tirá-la da ação.
COMUNICAR COM A CRIANÇA
A forma como comunicamos com a criança é outro ponto determinante da sua ação. A criança observa tudo em nós, a forma como falamos, a nossa expressão corporal e o tom de voz tudo isso é absorvido e entendido pela criança.
Encontrar um ponto de equilíbrio é o caminho:não ser demasiado firme, nem ser demasiado permissivo. A permissividade e o autoritarismo são ambos prejudiciais. Se a criança disser “não” algumas vezes, não dê demasiada importância, permaneça calma e firme sem entrar em disputas. Todos cedemos ocasionalmente!
A regra de ouro é fazer a criança compreender – repetidamente – que quem decide é você (deixando, ou não, que ela diga “não”). “Não” é “não”. Neste ponto, não deve ceder. Marcar os limites (sem o pai e mãe se contradizerem!) é essencial para a criança.
2024 – Mara Alves – Mãe, jornalista, consultora em Educação Montessori e autora do Montestory, o primeiro e único podcast jornalístico em português sobre Montessori.